Mosquito danado
"Mudanças
climáticas vão elevar casos de zika"
Especialista em patógenos da Univerdade da Flórida
prevê aumento de infecções no nordeste dos EUA, América Latina e sul da Europa.
"O aquecimento global tem criado áreas férteis para o vírus", afirma
Amy Vittor.
Apesar da falta de estudos que
comprovem uma relação direta, especialistas sustentam que o aquecimento global
tem contribuído para a propagação de doenças transmitidas por vetores como o mosquito
Aedes aegypti.
Amy Vittor, professora assistente
do Instituto de Patógenos Emergentes da Universidade da Flórida, prevê um
aumento de infecções pelo vírus zika no nordeste dos Estados Unidos, América
Latina e sul da Europa. Outro mosquito que transmite a doença, o Aedes
albopictus, também deve proliferar no norte da Austrália.
"Com o El Niño e as mudanças
climáticas, você deve ver mais chuva e mais umidade em algumas regiões e menos
em outras. Isso afetaria a população do mosquito em uma direção ou em outra.
Pelo o que temos visto esses fatores caminham juntos", afirmou em
entrevista à DW.
Deutsche Welle: O que tem
contribuído para a propagação do vírus zika, especialmente no caso do Brasil?
Amy Vittor:Podemos
tirar lições do vírus da dengue, parente próximo do zika. Em termos ambientais,
altas temperaturas permitem que a dengue se propague entre os mosquitos.
Provavelmente, esse também é o caso do zika, mas ainda não sabemos. A umidade
também permite que o Aedes aegypti de espalhe. Vemos em muitas regiões do
Brasil e em outros lugares que a população não tem telas de proteção [em
janelas e portas], nem ar condicionado, e um estilo de vida muito ao ar livre.
Geralmente por necessidade, elas talvez armazenem água perto de suas
residências, por não terem acesso a água corrente. Tudo isso contribui.
A Organização Mundial da Saúde
(OMS) relacionou o fenômeno El Niño à propagação do Aedes aegypti. Quão forte é
essa conexão?
Não vi nenhum dado recente do
Brasil que mostre, especificamente, ter havido um aumento do mosquito nas áreas
afetadas pelo fenômeno, em termos absolutos. Mas em casos concretos, isso com
certeza ocorreu, também em outros países da América Latina. Temos também visto
um aumento da dengue que parece ser consistente.
O El Niño, assim como as mudanças
climáticas, se comporta de forma diferente em diferentes regiões. Então, num
local pode-se ter mais chuva e mais umidade, e em outro, menos. Isso
presumivelmente afetaria a população do mosquito numa direção ou na outra. Pelo
que temos visto, talvez esses fatores de fato coincidam.
Autoridades de Honduras também adotam medidas
contra vetores do zika
O que já se sabe sobre a conexão
entre a mudança climática e as doenças transmitidas pelo mosquito?
Levando em consideração
[diferentes projeções das mudanças climáticas], parece que o número de vetores
da dengue, e também do zika, vai aumentar no nordeste dos Estados Unidos. Eles
vão seguir para o sul da América do Sul e se expandir em direção ao norte,
chegando ao sul da Europa; vão aumentar em termos de alcance na África Central
e no Leste da Ásia. E talvez haja um aumento em particular do mosquito Aedes
albopictus no norte e nordeste da Austrália. As mudanças não são enormes, mas
parecem estar consistentemente presentes.
Podemos estabelecer uma
correlação entre o zika e o aquecimento global?
A expansão do Aedes aegypti e do
Aedes albopictus pode ser um resultado das mudanças climáticas das últimas
décadas. Há outros fatores, como viagens aéreas, sem dúvida, mas poderíamos
dizer que o aquecimento global criou áreas férteis para que a doença se
estabeleça. A invasão do Aedes aegypti tem sido muitíssimo impressionante ao
redor do mundo. Essa é a correlação mais clara.
Técnica do Fiocruz examina larvas do Aedes aegypti
No futuro, as mudanças climáticas
poderiam afetar a propagação do zika e também de outras doenças transmitidas
por mosquitos? Em quais partes do mundo as pessoas estariam mais vulneráveis?
Devemos ver um aumento de doenças
em áreas específicas como o Nordeste dos Estados Unidos, certas regiões da
Europa, o Sul da América Latina e o Leste da Ásia.
O aquecimento global também
compromete nossa capacidade de nos protegermos dos mosquitos?
Se cooperarmos de fato em
períodos de alto risco, conseguiremos reverter boa parte desse risco. A
socioeconomia também tem um papel muito significativo, porque nos Estados
Unidos, por exemplo, o que faríamos com o aumento das temperaturas é justamente
ficar em locais fechados, aumentar o nível do ar condicionado e, assim, ficar
bem menos expostos ao mosquito, reduzindo dramaticamente nossos riscos, no
total. Em outras áreas, talvez não haja essa possibilidade. Então também é
preciso uma discussão séria sobre como, nós, humanos vamos nos adaptar às
mudanças.
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